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segunda-feira, outubro 31, 2005

Respondo de perfil
a quem de frente me imagina.

Alexandre O'Neill


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sábado, outubro 29, 2005

Quando no outono
as árvores estavam nuas
uma tarde a nuvem de pássaros
exaustos
poisou sobre os ramos.
Pareciam ter regressado as folhas
baloiçando ao vento.


Tonino Guerra

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quinta-feira, outubro 27, 2005

Na estrada,
ponho meu corpo
a ventos.
Aves me reconhecem
pelo andar.


Manoel de Barros


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quarta-feira, outubro 26, 2005

Há só tu dei-te o que não tinha
assistimos juntos à andorinha
desfiz-me em pedaços de ternura
quando a tua mão tocou a minha

quero lá saber do eu
ainda querer saber
de alguma coisa
parecida com a nossa
diferente da tua

a frase que aqui falta
é de vez em quando
se não te importas
dares pela minha falta


Joaquim Castro Caldas


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palavras que não me largam

Pelos degraus exteriores das casas
pessoas desembarcam da noite e dos seus sonhos


Lasse Soderberg



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terça-feira, outubro 25, 2005

Houve dias cheios de sol e jogos ágeis
em redor dos lagos, uma jornada na montanha
para ouvir o eco e a sombra da nuvem
ganhando alento nas vertentes como um barco
prodigioso.


Perseguíamos nas raízes do dia uma ausência
que alastrava para o norte, para essas planícies inventadas
onde pássaros ávidos tomariam por sementes
as palavras que dizíamos.


Éramos demasiado jovens
e aos nossos olhos
o mundo tinha a idade que mais nos convinha.



Rui Pires Cabral

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segunda-feira, outubro 24, 2005

faz agora um ano que um poema iniciou uma amizade (tão, mas tão linda)

UM OUTRO NASCIMENTO

Todo o meu ser é um cântico negro
que te levará
fazendo-te durar
ao despertar dos crescimentos e florescimentos eternos
neste cântico eu suspirei tu suspiraste
neste cântico
eu acrescentei-te à árvore à água ao fogo.

A vida é talvez
uma rua comprida pela qual uma mulher segurando
um cesto passa todos os dias.

A vida é talvez
uma corda com a qual um homem se enforca num ramo
a vida é talvez uma criança a regressar a casa da escola.

A vida é talvez acender um cigarro
na pausa narcótica entre fazer amor e fazer amor
ou o olhar ausente de um homem que passa
tirando o chapéu a um outro homem que passa
com um sorriso vazio e um bom dia.

A vida é talvez esse momento fechado
quando o meu olhar se destrói na pupila dos teus olhos
e está no sentimento
que eu irei pôr na impressão da Lua
e na percepção da Noite.

Num quarto grande como a solidão
o meu coração
que é grande como o amor
olha os simples pretextos da sua felicidade
o belo murchar das flores no vaso
a jovem árvore que plantaste no teu jardim
e o canto dos canários
que cantam para o tamanho de uma janela.

Ah
este é o meu destino
este é o meu destino
o meu destino é
um céu que desaparece com a queda de uma cortina
o meu destino é despenhar-me no voo de estrelas agora inúteis
reconquistar qualquer coisa no meio da putrefacção e da nostalgia
o meu destino é um passeio triste no jardim das memórias
e morrer na dor de uma voz que me diz
eu amo
as tuas mãos.

Irei plantar as minhas mãos no jardim
crescerei eu sei eu sei eu sei
e as andorinhas virão pôr ovos
no vazio das minhas mãos manchadas de tinta.

Vou usar
um par de cerejas gémeas como brincos
e pôr pétalas de dália nas minhas unhas
há um beco
onde os rapazes que se apaixonaram por mim
se demoram ainda com o mesmo cabelo despenteado
os mesmos pescoços finos e as mesmas pernas magras
e pensam nos sorrisos inocentes de uma rapariga
que foi levada pelo vento uma noite.

Há um beco
que o meu coração roubou
às ruas da minha infância.

A viagem de uma forma na linha do tempo
fecundando a linha do tempo com a forma
uma forma consciente de uma imagem
a regressar de uma carícia num espelho.

E é desta maneira
que alguém morre
e alguém segue vivendo.

Nenhum pescador jamais achará uma pérola num pequeno regato
que se esvazia num lago.

Eu conheço uma pequena e triste fada
que vive num oceano
e toca a flauta mágica do seu coração
suave, suavemente
pequena e triste fada
que morre com um beijo todas as noites
e com um beijo renasce a cada amanhecer.

Forough Farrokhzad


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sábado, outubro 22, 2005

Inki inki

Arvores, arbustos, ervas, tudo já se ressente da estação. Por toda a floresta, alastram-se grandes manchas amarelentas ou avermelhadas, a indicarem as folhas mortas, que já começaram a cair, despindo os troncos, juncando o chão. É uma supressão de vida que se anuncia, embora parcial e embora temporária. A natureza, após muita labuta, vai descansar, vai dormir, por algumas semanas, para despertar depois e recomeçar a mesma faina


Wenscelau de Moraes



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sexta-feira, outubro 21, 2005

Estendo meu corpo sobre as madeiras gretadas pelas
lágrimas, cheiro a linhaça e a sombra

Ah, a morfina em meu coração: durmo com os olhos
abertos diante de um território branco abandonado
pelas palavras

António Gamoneda



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quinta-feira, outubro 20, 2005

para a Insónia


Ó tão belos rostos,
absortos em Deus, industriosos na aurora,
ó bem-aventuradas virgens, como sois nobres!
Em vós o Rei se deleitou
quando vos conferiu todos os ornamentos celestes
e vos transformou em jardim de delícias,
com todos os perfumes inebriantes.


Hildegard von Bingen

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Na tarde cor de chuva a água
ferve Depois sobre as escuras
folhas mínimas vindas de outro tempo
cai rápida queimando no vapor
a memória que a serve

Gastão Cruz



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quarta-feira, outubro 19, 2005

Agora que perdemos os objectos
É tarde
Aqui não cabem mais histórias
Ficamos horas e horas
À espera que o eco
À deriva por entre a chuva
Tenha na voz os fragmentos de ontem


eue


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segunda-feira, outubro 17, 2005

se calhar há na distância a confirmação
de que vamos acumulando vazios

não tanto pelo que resta
mas sobretudo pela maneira
como o castelo de cartas
parece vacilar

apenas isso um tremor de paredes vazias
num tempo que não sei nomear

não é dia de fechar janelas
o papel amarelece e descola

e no fim resta o que acontece nas pausas

eue


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sábado, outubro 15, 2005

Hoje o Alice faz 3 anos

There's only Alice

It's dreamy weather we're on
You waved your crooked wand
Along an icy pond with a frozen moon
A murder of silhouette crows
I saw in the tears on my face
In the skates on the pond
They spelled Alice

I disappear in your name
But you must wait for me
Somewhere beneath the sea
There's a wreck of a ship
Your hair is like meadow grass on the tide
And the raindrops on my window
And the ice in my drink
Baby all I can think of is Alice

Arithmetic arithmetock
Turn the hands back on the clock
How does the ocean rock the boat?
How did the razor find my throat?
The only strings that hold me here
Are tangled up around the pier

And so secret kiss
Brings madness with the bliss
And I will think of this
When I'm dead in my grave
Set me adrift and I'm lost in your hair
And I must be insane
To go skating on your name
And by tracing it twice
I fell though the ice of Alice
There's only Alice


Tom Waits


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sexta-feira, outubro 14, 2005

é já amanhã
(porque será que a lebre espreita?hehehe)

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Aquela saia roda
como o topo do moinho de pás,
o que em mim confirma agora
que o vento me reveste.

Fiama Hasse Pais Brandão


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quinta-feira, outubro 13, 2005

Remorso

Durante a leitura nocturna
descia, às vezes, as escadas
e procurava no escuro, dentro
de um cesto, uma forma
redonda. Na quadra iluminada
do quarto, mordia depois a maçã
vermelha escura. Era enorme o ruído
dos dentes, no silêncio dessa hora
tardia e irremediável a culpa
de ter destruído aquela polpa húmida
de onde pendia o descarnado pé
no íntimo saber de pequenas sementes
que podia perfeitamente
ter apodrecido em paz.

Inês Lourenço.


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quarta-feira, outubro 12, 2005

a mulher é uma imagem de silêncio
a sua vocação é ser paisagem

por vezes sente-se uma árvore cortada
e veste o céu de madrugada

num corpo a corpo com a terra
os dias são vento e chuva -
regresso às margens de Outono

e em pequenos gestos cria raízes no vento


eue


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Está oficialmente inaugurada a temporada das constipações

Snif... snif

ATCHIM, ATCHIM, ATCHIM, ATCHIM, ATCHIM, ATCHIM, ATCHIM, ATCHIM, ATCHIM, ATCHIM, ATCHIM, ATCHIM, ATCHIM, ATCHIM, ATCHIM, ATCHIM, ATCHIM, ATCHIM, ATCHIM

Snif... snif


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terça-feira, outubro 11, 2005

As lágrimas
são locais de olhar por dentro
e enquanto espero que os verbos
sequem
poucas palavras me restam para dizer
que só a sombra tem corpo
e em frases soltas
crescem-me pássaros no reverso dos olhos


eue


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sexta-feira, outubro 07, 2005

das tentativas de sono ficaram histórias a roubar-lhe a voz
memórias avulsas vincadas na pele

o sono é ainda uma cova na cama desfeita
e sem afastar a manhã dos olhos

falta-lhe a noite para contar as estrelas


eue


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quinta-feira, outubro 06, 2005

A minha intimidade é pequena
cabe na minha boca
e desliza por entre os dentes;

se a descubro a fingir que é saliva
engulo-a,
não quero vê-la alheia nas palavras
nem perdê-la com um beijo


Ana Merino



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terça-feira, outubro 04, 2005

Tréguas

este poema é para ti.
é uma oferta de tréguas
dizendo que
nada no teu coração negro
me poderá assustar.
Olhei tempo demais
para o meu próprio coração.
Obrigada pela dádiva
das tuas incertezas.

Eunice de Souza


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domingo, outubro 02, 2005

Liberdade


Desligada
O vento morde meus cabelos sem medo:
Tenho todas as idades.


Olga Savary


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